ARMAGEDDON - Torcendo pelo meteoro!

Cena 1

O escritor e jurista Ruy Barbosa preocupado com República a qual apoiou mostra-se agora arrependido.

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto ... Essa foi a obra da República nos últimos anos.
No outro regime o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre - as carreiras políticas lhes estavam fechadas. Havia uma sentinela vigilante, de cuja severidade todos se temiam a que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade gerais.

Na República os tarados são os tarudos. Na República todos os grupos se alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições. Contentamo-nos, hoje, com as fórmulas e aparência, porque estas mesmo vão se dissipando pouco a pouco, delas quase nada nos restando. Apenas temos os nomes, apenas temos a reminiscência, apenas temos a fantasmagoria de uma coisa que existiu, de uma coisa que se deseja ver reerguida, mas que, na realidade, se foi inteiramente.

E nessa destruição geral de nossas instituições, a maior de todas as ruínas, Senhores, é a ruína da justiça, colaborada pela ação dos homens públicos, pelo interesse dos nossos partidos, pela influência constante dos nossos Governos. E nesse esboroamento da justiça, a mais grave de todas as ruínas é a falta de penalidade aos criminosos confessos, é a falta de punição quando se aponta um crime que envolve um nome poderoso, apontado, indicado, que todos conhecem .”

De todos os temas que ocupam a sua mente, a questão da justiça, sobretudo da instituição judiciários é a que mais o preocupa.

"A justiça, cega para um dos dois lados, já não é justiça. Cumpre que enxergue por igual à direita e à esquerda."
"Saudade da justiça imparcial, exata, precisa. Que estava ao lado da direita, da esquerda, centro ou fundos. Porque o que faz a justiça é o “ser justo”. Tão simples e tão banal. Tão puro. Saudade da justiça pura, imaculada. Aquela que não olha a quem nem o rabo de ninguém. A que não olha o bolso também. Que tanto faz quem dá mais, pode mais, fala mais. Saudade da justiça capaz. (...)
"A injustiça, por ínfima que seja a criatura vitimada, revolta-me, transmuda-me, incendeia-me, roubando-me a tranquilidade do coração e a estima pela vida."

Cena 2

No Brasil Império o padre Antônio Vieira prega um sermão sobre um tema semelhante. Pregado a 13 de junho de 1654 (dia de Santo Antônio), na cidade do Maranhão, o “sermão de Santo Antônio” é uma continuação ao sermão das “Tentações”. Nesta época, Portugal tinha recuperado a Independência e passada atenção dispensada ao sermão das “Tentações”, os colonos logo esqueceram a ameaça do Fogo do Inferno, e voltaram a exigir a posse dos escravos, sem qualquer controle dos jesuítas (ordem religiosa a que pertencia Vieira), que contestavam a escravidão dos povos indígenas.

Três dias depois de o pregar, António Vieira embarcou ocultamente para Lisboa, para tentar conseguir obter junto do rei D. João IV leis que garantissem direitos básicos aos índios brasileiros, que os protegessem da exploração dos colonos brancos. Vieira conseguiu atingir os seus objetivos, a contragosto dos colonos que assim perdiam parte da sua mão de obra barata, que eles exploravam impiedosamente.

“Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!”

O clérigo questionava a incoerência entre a postura cristã e a aceitação da exploração dos povos indígenas pelo colonos brasileiros.

“Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há e fazer a este sal e que se há e fazer a esta terra? O que se há e fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há e fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.”

Cena 3

No primeiro Século da era cristã, lemos as palavra de Jesus segundo o Evangelho de S. Marcos:

“Quando ouvirem falar de guerras e rumores de guerras, não tenham medo. É necessário que tais coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. Nação se levantará contra nação, e reino contra reino. Haverá terremotos em vários lugares e também fomes. Fiquem atentos, pois vocês serão entregues aos tribunais e serão açoitados nas sinagogas. O irmão trairá seu próprio irmão, entregando-o à morte, e o mesmo fará o pai a seu filho. Filhos se rebelarão contra seus pais e os matarão. Quando vocês virem ‘o sacrilégio terrível’ no lugar onde não deve estar — quem lê, entenda — então, os que estiverem na Judéia fujam para os montes. Quem estiver no telhado de sua casa não desça nem entre em casa para tirar dela coisa alguma. Quem estiver no campo não volte para pegar seu manto. Porque aqueles serão dias de tribulação como nunca houve desde que Deus criou o mundo até agora, nem jamais haverá. Se o Senhor não tivesse abreviado tais dias, ninguém sobreviveria. Mas, por causa dos eleitos por ele escolhidos, ele os abreviou.”

Tomando os contextos acima (três exemplos entre tantos) e os relacionarmos com Brasil e o mundo de modo geral, é desalentador a quem tem alguma sensibilidade a realidade que esbofeteia as nossas faces. Já não acredito mais nos seres humanos. Não creio na ética, na razão, nas instituições, nas religiões, nem na evolução moral da espécie. Beira o niilismo a ideia de que algo realmente possa fazer algum sentido, mesmo que nos tempos vindouros. Parece mais acertada a frase atribuída a Albert Einstein: “Não sei como será a terceira guerra mundial, mas sei como será a quarta: com pedras e paus.”

Diante do quadro de adoecimento crônico da humanidade (a desumanização); frente a pandemia do mal do mundo e no mundo, veio à mente o filme ARMAGEDDON.

“Após uma chuva de pequenos meteoros que atingem a Terra (incluindo Nova York), a NASA se dá conta de que um asteroide do tamanho do Texas está em um curso de colisão com o nosso planeta. O asteroide se aproxima da Terra à uma velocidade 35.000km/h. e, se o choque acontecer, qualquer forma de vida deixará de existir na Terra, exatamente como o que exterminou os dinossauros 65 milhões de anos atrás.”

Na época que assisti o filme torci para que a expedição fosse bem sucedida e conseguisse destruir o meteoro. Hoje, lembrando da história, torço pelo meteoro!

Referências:

- Ruy Barbosa - Discursos Parlamentares - Obras Completas  (Vol. XLI - 1914 - TOMO III - pág. 86/87)
- Obras completas de Rui Barbosa" Tomo IV - Página 60, de Ruy Barbosa
- Obras completas, Volume 19, Parte 3 - página 109, Ruy Barbosa - Ministério da Educação e Saúde, 1942
https://pt.wikipedia.org/wiki/Serm%C3%A3o_de_Santo_Ant%C3%B3nio_aos_Peixes
http://valiteratura.blogspot.com/2011/06/sermao-de-santo-antonio-ou-dos-peixes.html
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ua000257.pdf
Marcos 13.7-20
http://www.adorocinema.com/filmes/filme-17947/

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